JMV News

Zezé Motta narra a autobiografia de Viola Davis: ‘Semelhanças existem, apenas o cenário muda’

Os ouvintes do audiolivro da autobiografia de Viola Davis, intitulado “Em Busca de Mim”, terão a oportunidade de ouvir uma voz bastante conhecida no Brasil: Zezé Motta é a narradora da versão brasileira, que é uma exclusividade da Audible. O convite para participar do projeto surgiu de forma inesperada, como revelou a atriz em entrevista à Splash. Enquanto lia a obra de Davis, recebeu uma proposta de Taís Araújo para visitar sua casa e conhecer Viola pessoalmente. Davis e Araújo mantêm uma amizade que, em uma conversa recente com a Splash, a atriz americana descreveu como “espiritual”.

Zezé compartilhou: “Eu sou um pouco avessa a sair de casa. Geralmente, só saio para trabalhar. Mas, nesse caso, decidi aceitar o convite da Taís e achei incrível estar lendo o livro da Viola ao mesmo tempo em que recebi a proposta de conhecê-la.” Durante o encontro, Motta e Davis tiveram uma breve conversa, que ela descreveu como “ótima”. Algumas semanas depois, recebeu a proposta da Audible para narrar a obra. “Percebi que não existem coincidências. Isso foi um sinal. Aceitei prontamente.”

“Em Busca de Mim” é uma autobiografia que detalha a difícil trajetória da infância de Viola Davis até seu sucesso como atriz, abordando questões como racismo e os traumas que a marcaram. A narrativa também fala sobre a busca por autoconhecimento, aceitação e o poder transformador da arte em sua vida.

Motta revelou que as gravações duraram meses e que, em cada dia, se emocionou com a história de Viola. “Que mulher forte, resiliente, determinada a vencer.” Ao ser questionada sobre as similaridades entre suas histórias de vida, Motta observou que as semelhanças não existem apenas entre elas, mas entre todas as mulheres negras. “Nossas histórias se entrelaçam. Se você prestar atenção, verá que são bem similares… A mesma desigualdade, os abusos, o racismo, as torturas. Tudo é igual, só muda o endereço.”

Essa não é a primeira vez que Motta narra um audiolivro. Em 2022, ela deu voz a “Torto Arado”, de Itamar Vieira Junior, uma das obras mais impactantes da literatura brasileira dos últimos anos, que conquistou os principais prêmios literários do país, incluindo o Jabuti, em 2020, e se tornou um dos mais vendidos de 2021.

A atriz afirmou que tanto “Em Busca de Mim” quanto “Torto Arado” foram narrativas que a tocaram profundamente. “Ambas as histórias são intensas e me emocionaram do início ao fim. ‘Torto Arado’ possui um vocabulário mais sofisticado, enquanto ‘Em Busca de Mim’ traz a história verdadeira e forte de Viola, que é repleta de tristeza, mas também de resiliência.”

Apesar de sua longa trajetória, a artista encontrou novos desafios durante o processo de narração. “Cada narração possui suas particularidades e vocabulários… São histórias contadas, cada uma com suas questões. O processo pode ser lento, pois exige atenção, pausas e entonação, além de nos imergir na narrativa. Precisamos saborear cada palavra, cada frase, cada ponto.”

Para Zezé Motta, a literatura é um caminho fundamental para a evolução intelectual da sociedade. “Os livros educam e ensinam. No Brasil, ainda somos um país com grande ignorância em relação ao racismo. É crucial educar, transformar conceitos e questionar estruturas. Livros e histórias são essenciais.”

Superação sempre foi uma constante na vida de Motta. “Passei por muitas dificuldades para chegar até aqui, aos 80 anos, com 55 anos de carreira, mais de 70 filmes e diversos projetos na TV e na música.” Ela recordou um episódio de sua juventude que a fez perceber que o preconceito está enraizado, mesmo entre os negros e os menos favorecidos. “Durante uma apresentação de Natal que fizemos, quase fomos apedrejados pelo público ao apresentarmos uma Virgem Maria negra e um José negro. Se eu tivesse me deixado abater naquela hora, não teria chegado até aqui.”

Em 1966, a jovem atriz começou seu curso de teatro, mas não acreditava que conseguiria viver da arte. “Entrei para o curso de Contabilidade, onde me formei, porque aprendi com meus pais o valor do trabalho.” Quando uma vizinha soube que Motta estudava teatro, comentou: “Ué, não sabia que para fazer papel de empregada precisava de curso.” “Isso foi só mais um exemplo do preconceito que enfrentei. Na maioria dos lugares que frequentei, como o curso de inglês e o Tablado, eu era a única negra. Passei por situações de desprezo e cheguei a querer ser branca para ser aceita. Demorou até eu conseguir me aceitar como sou e superar essa ‘alienação’.”

Com o passar dos anos, Zezé Motta se alegra ao notar o aumento da representação negra no audiovisual. “É uma vitória ver a diversidade na televisão. No passado, personagens negros não tinham família, eram apenas figurantes nas histórias. Sinto que estamos evoluindo e isso me traz esperança. Fiz meu papel ao denunciar a ausência do negro no audiovisual e fico feliz em estar viva para testemunhar isso. Ainda há muito a ser feito, mas já avançamos.”

Aos 80 anos, a atriz não pensa em se aposentar tão cedo. “Eu não paro! Após os 75, parece que fui redescoberta. Hoje, trabalho mais do que quando tinha 50 ou 60 anos. Estou prestes a estrear um projeto inédito, que ainda não posso revelar, mas será uma bela celebração dos meus 80 anos, com apresentações que mostrarão meu lado como cantora e atriz. O evento ocorrerá de maio a novembro.”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima