JMV News

‘O Eternauta’: descubra a trágica realidade que inspirou o novo sucesso estrelado por Darín

A icônica história em quadrinhos argentina de ficção científica, O Eternauta, lançada em 1957, acaba de ganhar sua primeira adaptação televisiva. Disponível na Netflix desde 30 de abril, a série de seis episódios é protagonizada por Ricardo Darín, que dá vida a Juan Salvo, um homem comum que se torna um viajante do tempo e do espaço após uma nevasca tóxica que extermina milhares de habitantes em Buenos Aires, em sua busca desesperada por sua família.

Com efeitos visuais de ponta, a produção narra a jornada de Salvo — que se transforma no Eternauta, um viajante perpétuo — enquanto ele se une a um grupo de resistência na luta pela sobrevivência e, posteriormente, enfrenta uma ameaça alienígena que visa destruir o planeta.

Entretanto, essa produção traz consigo uma trágica narrativa relacionada ao criador dos quadrinhos. Vinte anos após a criação de O Eternauta, o renomado autor argentino Héctor Germán Oesterheld enfrentou um destino similar ao de seu personagem durante a ditadura militar que assolou o país.

Na trama dos quadrinhos, alienígenas aniquilam implacavelmente a população de Buenos Aires. Na realidade argentina, a junta militar de Jorge Rafael Videla instaurou um regime opressivo em 1976, que aterrorizou a população. Oesterheld e sua família foram sequestrados pelos militares.

Quando a ficção científica espelha a realidade
O Eternauta é um reflexo profundo da visão e dos valores de Oesterheld, que infundiu sua perspectiva social e política na narrativa dos quadrinhos, em um contexto de Guerra Fria. Essa visão o levou a se unir à resistência contra o regime militar, junto com suas quatro filhas.

Eles fizeram parte do grupo Montoneros, uma organização política-militar que se opunha à ditadura. No entanto, em 1977, todos foram sequestrados e se tornaram parte dos 30 mil argentinos desaparecidos durante esse período.

Os corpos do autor e de suas filhas nunca foram encontrados. Desde então, foi confirmado que suas filhas foram assassinadas, e acredita-se que Oesterheld tenha sido morto pelo regime em 1979.

Na tragédia da família Oesterheld, os militares deixaram apenas sua esposa, Elsa Sánchez, e dois netos pequenos: Martín Mortola Oesterheld, de 4 anos, e Fernando Araldi Oesterheld, de 1 ano.

Um símbolo contra o esquecimento
A obra de Oesterheld, ilustrada por Francisco Solano López, tornou-se um marco na Argentina. Até hoje, O Eternauta é reconhecido como um forte símbolo de resistência contra o esquecimento – um lembrete constante de um dos períodos mais sombrios da história do país. Para muitos, essa história ainda não chegou ao fim.

Na ficção, o herói passa sua vida à procura de sua família através do tempo e do espaço. Da mesma forma, milhares de argentinos ainda permanecem sem saber o que ocorreu com seus entes queridos durante a ditadura militar, continuando a busca por pais, filhos e netos desaparecidos.

Há quase cinquenta anos, por exemplo, o grupo Abuelas de Plaza de Mayo tem lutado para localizar quase 500 bebês que foram sequestrados durante a ditadura e criados sob falsas identidades.

A estreia da série na Netflix reacendeu as buscas pelos possíveis netos ou netas de Oesterheld, que nasceram em cativeiro. Segundo o El País, Diana Oesterheld, uma das filhas do autor, estava grávida de seis meses quando foi sequestrada, enquanto Marina Oesterheld estava prestes a dar à luz.

“Você está assistindo a ‘O Eternauta’? Se sim, e nasceu em novembro de 1976 [data prevista para o parto de Diana] ou entre novembro de 1977 e janeiro de 1978 [possível nascimento do filho ou filha de Marina] e tem dúvidas sobre sua identidade ou a de alguém que nasceu nessas datas, entre em contato com a Abuelas Difusión”, divulgou a organização Avós da Praça de Maio, em colaboração com o grupo de direitos humanos HIJOS (Filhos e Filhas pela Identidade e Justiça contra o Esquecimento e o Silêncio).

Assim, a figura de Juan Salvo, que pode ser vista em murais e grafites por toda Buenos Aires, transcende a de um mero personagem de ficção científica. Ele se tornou um símbolo político e um memorial vivo, lembrando aos argentinos da importância de enfrentar o passado e de lutar incessantemente pelos direitos humanos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima