JMV News

O Oscar é nosso, mas e o que vem a seguir?

Na data de ontem (15), a Academia Brasileira de Cinema decidiu que “O Agente Secreto”, dirigido por Kleber Mendonça Filho, será o filme que representará o Brasil no Oscar 2026. Entre os seis finalistas que concorreram a essa honra estavam também “Manas”, de Marianna Brennand; “O Último Azul”, de Gabriel Mascaro; “Baby”, de Marcelo Caetano; “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal; e “Oeste Outra Vez”, de Erico Rassi.

Se você acompanhou as notícias, deve ter percebido o burburinho que surgiu desde a divulgação dos finalistas na semana passada. As redes sociais foram inundadas com debates acalorados sobre qual filme deveria ser escolhido, com muitas opiniões divergentes e até acusações de lobby. O Twitter se transformou em um verdadeiro campo de batalha cinematográfico, onde as torcidas se manifestaram com veemência.

Entretanto, me pergunto se realmente vale a pena investirmos tanta energia discutindo prêmios internacionais quando temos questões tão importantes a resolver internamente. Não me interpretem mal: reconheço a relevância do Oscar. A conquista histórica de “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, que trouxe ao Brasil seu primeiro Oscar em 2025, elevou ainda mais as expectativas para essa nova disputa. É realmente emocionante ver nosso cinema brilhar no cenário internacional e ser reconhecido por sua cultura.

Contudo, enquanto nos dedicamos a debater qual filme deve tentar a sorte em Hollywood, mais de 750 profissionais do setor, incluindo cineastas, atores, produtores e roteiristas de todas as partes do Brasil, assinaram uma carta em apoio à regulação do streaming no país, mas essa luta não se torna tendência nas redes sociais.

Já pensou se canalizássemos a mesma energia que empregamos nas discussões sobre o Oscar para questões como: por que as plataformas não são obrigadas a exibir uma cota justa de conteúdo brasileiro? Por que não há uma regulamentação que proteja nossos criadores? Por que não falamos sobre o desenvolvimento do público para o cinema nacional?

Eu, pessoalmente, torço para que nossos filmes sejam indicados, ganhem prêmios e façam sucesso fora do Brasil. Mas me preocupo se, ao olharmos para Hollywood, estamos negligenciando nosso próprio cenário.

Vejamos alguns dados: atualmente, o Brasil possui 3.509 salas de cinema para uma população de 215 milhões de habitantes. Isso resulta em cerca de 58 mil pessoas por sala. Em comparação, a Argentina tem 49 mil, o Chile 39 mil, o México 17 mil e a Coreia do Sul 15 mil habitantes por sala. Aproximadamente 84 milhões de brasileiros residem em municípios que não possuem cinemas. E enquanto isso, debatemos qual filme deve tentar a sorte em Hollywood.

Além disso, o investimento da Ancine em distribuição é bastante reduzido em relação ao que é destinado à produção. Enquanto os filmes de Hollywood chegam ao Brasil com orçamentos robustos para promoção, nossos filmes lutam para se destacar nas poucas salas disponíveis.

Esse ciclo é implacável: sem cinemas nas proximidades e sem recursos para convencer o público a sair de casa, como podemos formar uma audiência para o audiovisual nacional?

O apreço que temos pelo cinema brasileiro não deve se restringir apenas à torcida por seu reconhecimento internacional. É essencial também nutrir o amor por uma indústria forte, justa e sustentável em nosso próprio país. Uma indústria que remunere adequadamente seus profissionais, que conte histórias de todas as regiões e que trabalhe na formação de público.

O Oscar é maravilhoso, mas não é ele que vai transformar a vida de quem faz cinema nas periferias ou em áreas remotas, longe dos holofotes. Sem regulamentação, o Brasil corre o risco de se tornar apenas um mercado consumidor, sem consolidar uma indústria nacional capaz de gerar emprego, renda e uma projeção internacional sustentável.

Portanto, vamos continuar torcendo pelos nossos filmes e suas conquistas no exterior, mas sem perder de vista que a verdadeira valorização do audiovisual brasileiro acontece aqui. Nas nossas leis, nas nossas políticas, na criação de mais salas de cinema no interior, no investimento em distribuição e na formação de público. Em nossa rotina diária.

Porque, no final das contas, conquistar um Oscar é extraordinário. Mas construir uma indústria audiovisual próspera e acessível a todos os cantos do país é verdadeiramente transformador. É só perguntar aos Estados Unidos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima