É inegável que a inteligência artificial (IA) tem se tornado uma parte integrante do cotidiano. Entre as diversas ferramentas disponíveis, o ChatGPT se destaca. De acordo com dados recentes da Semrush, em fevereiro de 2025, o Brasil alcançou a quarta posição no ranking mundial de acessos ao site do ChatGPT, com 4,09% do total de visitas, o que equivale a cerca de 212 milhões de acessos.
“Com uma audiência cada vez mais conectada, tendências virais, como as imagens de anime geradas por IA, encontram um ambiente propício para se propagar rapidamente, impulsionadas pelo desejo de engajamento nas redes sociais”, afirma Thiago Muniz, CEO e cofundador da Receita Previsível.
“Quando celebridades começaram a compartilhar versões em anime de si mesmas criadas por IA, o nome ‘ChatGPT’ logo se tornou popular. O que parecia ser uma ação inocente se transformou em uma campanha viral de grande alcance. O que podemos aprender com essa dinâmica e o que sua marca deve considerar?”, questiona Muniz.
Segundo Muniz, quando um influenciador publica uma imagem anime e menciona: “Usei o ChatGPT!”, isso gera milhões de impressões espontâneas – um tipo de reconhecimento que as marcas frequentemente gastam enormes quantias para conseguir por meio de publicidade paga.
No entanto, há um aspecto mais complexo em jogo: um vasto experimento de pesquisa comportamental disfarçado de diversão. Por trás da leveza e do apelo visual de transformar uma foto em anime, existe um processo sofisticado: cada imagem criada, compartilhada ou comentada se torna um dado sobre comportamento.
“É como se milhões de indivíduos estivessem, de forma voluntária, participando de um experimento global sobre estética, identidade e engajamento — sem perceber que estão contribuindo com informações valiosas para treinar algoritmos, mapear tendências culturais e ajustar estratégias comerciais baseadas em padrões emocionais”, explica Muniz.
O especialista ressalta que poucas marcas percebem uma camada crítica: “Estamos apenas observando o comportamento humano ou estamos, de fato, moldando novas formas de percepção sem perceber?”.
Essas ações virais tendem a surgir periodicamente. Em 2022, o aplicativo Lensa AI gerou uma onda semelhante com avatares artísticos. O Canva também introduziu filtros no estilo anime. Agora, é a vez do ChatGPT.
Entretanto, essas iniciativas vão além do mero entretenimento. Elas capacitam sistemas a aprender com nossas imagens e padrões, o que nos leva a sacrificar parte da nossa autonomia perceptiva.
As máquinas começam a identificar e trabalhar com padrões que nem sempre temos consciência de que estamos revelando: características de beleza, expressões emocionais, combinações de cores e estilos visuais que atraem mais cliques.
“No auge da popularidade do Lensa, muitos avatares gerados eram, em várias ocasiões, mais magros, sexualizados e ‘idealizados’ do que as imagens reais dos usuários. Diversos relatos indicaram que essas imagens reforçavam padrões estéticos irrealistas — sem que ninguém houvesse solicitado isso. O modelo, treinado com amplos bancos de imagens (frequentemente enviesados), não apenas refletia um gosto coletivo: ele o reforçava”, recorda.
Esse é o ponto crucial. O perigo não reside apenas na utilização dos dados, mas no fato de que a IA, ao tentar criar o “mais bonito” ou “mais engajável”, pode induzir preferências, reforçar estereótipos ou invisibilizar corpos e características fora da média estatística.
O risco? Confundir pesquisa com manipulação. A IA pode, sutilmente, não apenas captar preferências, mas moldá-las — o que coloca as marcas em um terreno ético delicado: você está compreendendo ou influenciando o comportamento do seu público?
Thiago Muniz acredita que é possível extrair lições dessa tendência e aplicar princípios semelhantes para gerar leads e construir relacionamentos. Contudo, é fundamental ir além da mera estética.
A IA tem o potencial de gerar engajamento. No entanto, as marcas que prosperam são aquelas que conseguem transformar a atenção em diálogo — e o diálogo em relacionamento. Campanhas como Lensa AI e FaceApp demonstraram isso: o pico de atenção é intenso, mas o ciclo é curto. Sem uma narrativa, um serviço ou uma proposta de valor clara, a onda se torna efêmera. E o público percebe quando é apenas utilizado como um “experimento de imagem”.
Utilize o hype como uma porta de entrada — mas desenvolva um caminho a seguir. Se optar por usar IA ou interatividade, conecte isso a um conteúdo relevante que venha em seguida: um diagnóstico, uma mentoria, uma jornada de onboarding. A imagem serve apenas como um convite.
Não é suficiente gerar impacto. Pergunte-se: o que a pessoa sente ao ver, compartilhar e depois de compartilhar? Existe continuidade? Há uma história a ser contada?
Se você solicitar um e-mail ou nome, explique o motivo. O que a pessoa receberá em troca? Como você usará essa informação para ajudá-la?
Nem todo canal será explosivo. Contudo, pode ser profundo. Às vezes, um pequeno grupo engajado vale mais do que um viral com mil curtidas e sem retorno.
O que a OpenAI está fazendo é observar o que nos motiva. Mas sua marca pode ir além: pode observar com ética e sensibilidade. Pode usar a IA como um elo — e não como uma distração. E pode transformar estética em estratégia, hype em conversa e dados em relações duradouras.




